sábado, 5 de junho de 2010

O nascimento de Jesus.


Resumo
            Neste trabalho, faremos o estudo exegético do nascimento de Jesus em Mt 1.18-25. Verificando através da tradição desta comunidade questões relativas ao nascimento virginal de Jesus e a justiça de Deus, para uma comunidade de judeus cristãos.

Palavras chaves: Justo, judeu cristão e Nascimento Virginal.

O Nascimento de Jesus Cristo (Mt 1. 18-25)[1]
18Eis qual a origem de Jesus Cristo. Maria, sua mãe, estava prometida em casamento a José.
Ora antes de terem coabitado, achou-se grávida por obra do Espírito Santo.
19José, seu esposo, que era um home justo e não queria difamá-la publicamente, resolveu repudiá-la secretamente.
20Tal era o projeto que concebera, mas eis que o Anjo do Senhor lhe apareceu em sonho e disse: “José filho de Davi, não temas receber Maria tua esposa: o que foi gerado nela provém do Espírito Santo, 21e ela dará a luz a um filho a quem porás o nome de Jesus, pois é ele que salvará o seu povo dos seus pecados. 22Tudo isto aconteceu para se cumprir o que o Senhor dissera pelo profeta. 23Eis que a virgem conceberá e dará à luz um filho, ao qual darão o nome de Emanuel, o que se traduz: Deus conosco. 24Ao despertar, José fez o que o Anjo do Senhor lhe prescrevera: acolheu em sua casa a sua esposa, 25mas não a conheceu até quando ela deu a luz um filho, ao qual ele deu o nome de Jesus.

Momento da tradição
            Antes de iniciar nosso estudo exegético, é importante lembrar que o grupo de Mateus era uma comunidade de judeus cristãos[2]. Esta informação deverá nortear nossos esforços, para compreender as razões que moveram os letrados de Mateus fazer esta descrição do nascimento de Jesus.



Estudo exegético
            No v.18 verificamos que Maria estava prometida a José neste ponto verificamos que José e Maria eram esponsais, e este compromisso, era muito mais sério que o atual noivado, os noivos juravam fidelidade perante testemunhas, era o mesmo que o matrimonio em si, por este motivo veremos adiante José sendo chamado de esposo de Maria[3].
            Esclarecido que José e Maria já estavam casados o autor conta que por obra do Espírito Santo ela fica grávida antes do casal ter tenham relações.
O fato de Maria ficar grávida antes do final do período de esponsais, ou seja, antes de coabitar com seu esposo a torna adúltera, passível de pena de morte (Lv 20.10b certamente morrerá o adultero e a adultera.[4]). Todavia esta lei já havia sido modificada e não havia mais este receio[5]. Mas com certeza ela seria vitima das más línguas, difamada e desonrada por todos.
Em uma sociedade onde a mulher era propriedade do marido[6], José poderia ou até deveria repudiar sua mulher, pela quebra dos votos.
Mas no v.19 o autor conta que José é um homem justo e não queria expô-la publicamente, por isto decide dar-lhe a carta de divorcio e dispensá-la secretamente.
Neste ponto verificamos um importante conflito. José queria levar Maria para sua casa e viver com ela, mas por ser justo não podia, pois ela havia rompido com seu juramento de fidelidade, e por isto ele tinha que dispensá-la, mas resolveu fazer isto em segredo, pois a amava? Ou iria dispensá-la por sua traição, mas por ser misericordioso resolveu fazê-lo de forma privada?
Para entender este ponto, temos que fazer um exercício, para entender o que este evangelho entende por justo. Para tanto vamos verificar nele outras ocorrências desta palavra.
Mt 5.45b pois ele faz nascer o seu sol sobre os maus e os bons, e cair a chuva sobre os justos e os injustos.
Bons
Maus
Justos
Injustos
 Nota-se neste versículo o paralelismo sinonímico do quadro acima.
Mt 13.43 Então os justos resplandecerão como o sol, no Reino do seu Pai.
            Mt 13. 48-50 Quando está cheia, puxam-na para a praia, depois, sentados, juntam em cestos o que é bom e jogam fora o que não presta. Assim acontecerá no fim do mundo: os anjos sobrevirão e separarão os maus dentre os justos e os lançarão na fornalha de fogo;
Jogam fora o que não presta
Juntam e cestos o que é bom
separarão os maus dentre os
Justos
Lançarão na fornalha de fogo

            Existem outras ocorrências da palavra justo no evangelho de Mateus, mas estes exemplo já nos ilustram que para este grupo, os justos são bons, e dos justos é o Reino de Deus. Contudo acredito que ainda temos que esgotar este assunto. O que é ser bom?
            Se José desejava ficar com Maria, ou se não apenas quis deixá-la ao saber de sua traição, não importa em qual destas opções estão os sentimentos de José, ele optou por fazê-lo em segredo, e não instaurando um processo de divórcio, para não expor sua esposa ao repúdio da comunidade. Assim sua decisão é sempre baseada no amor. A justiça em Mateus tem por base o amor.
            No v.20 José já havia tomado sua decisão, neste ponto entra um anjo do Senhor, o anjo diz “José filho de Davi”, pois a genealogia anterior era a de José, assim em Mateus, José é quem passa legalmente a descendência davídica a Jesus.
            Interessante notar aqui que mesmo na tradição de Lucas, a genealogia é a de José.
            A seguir, o anjo diz para José não temer em receber Maria como sua esposa. O que ele temia? Ele queria Maria, mas não se atrevia a fazê-lo? Neste caso não havia mais problema, ela não havia lhe sido infiel[7].
            Nas profecias não se encontram narrativas do nascimento virginal do messias, isto deve ter sido emprestado de fontes pagãs1 . Is 7.14 se refere a um sinal que Deus dará como um sinal que os reis da Síria e Israel não prevalecerão naquela guerra contra o reino de Acaz em Judá. Esta mesma profecia em Isaias traz controvérsias, pois há quem afirme que a palavra usada seria mulher jovem e não virgem[8]. Ulrich Luz diz que o nascimento virginal de Jesus prepara o leitor para crer que Jesus é o filho de Deus, abrindo caminho para todo o tema cristológico que será desenvolvido[9].
            Ainda na questão da concepção virginal, conforme vimos, o tema pode ter vindo de fontes pagãs, contudo o próprio Willian Hendriksen continua sua analise.
            Os mitos da época, em relação à concepção por intervenção divina eram carregados de indecência, com deuses estuprando mulheres ou as seduzindo para um ato sexual. Assim não podemos comparar estes exemplos com a delicadeza da situação de Maria, que “achou se grávida por obra do Espírito de Deus”.  Desta forma não há como buscar nestes exemplos fontes para os relatos em Mateus e Lucas.
            Diante desta afirmação, qual a origem destes relatos? Só nos resta afirmar que se trata de uma informação verdadeira. E procurando em todo novo testamento, não encontramos contradições a este respeito.
            O nascimento virginal de Jesus tem importância doutrinária, uma vez que o Cristo sobrenatural, e a salvação sobrenatural trazem consigo inevitavelmente o nascimento sobrenatural. Pois como poderia o Jesus filho de José e Maria, participante da culpa de Adão, sem capacidade de salvar a si mesmo, salvar a outros do pecado?[10]
            A seguir temos a questão do Emanuel, este nunca foi o nome de Jesus nem mesmo nenhum título que houvesse recebido. Mas este termo, que quer dizer “Deus conosco” traz um vínculo com o último versículo do evangelho “eis que estou convosco todos os dias, até a consumação dos tempos”. Este afirmação marca o tema fundamental que Jesus glorificado está com a comunidade mateana[11].
            Por fim no v.24 este evangelho afirma a retidão de José que em obediência ao que lhe foi dito, leva Maria para sua casa, e em submissão a Is. 7.14 “eis que a virgem dará a luz”, não manteve relações sexuais com sua esposa até o nascimento do menino. Ainda em obediência ao revelado pelo anjo do Senhor, José chama o menino de Jesus, o que faz em concordância com Maria (Lc 1.31).
           
Conclusão e contextualização hermenêutica.
            A partir da revolução industrial, as pessoas deixaram de ser simplesmente humanos, somos apenas aquilo que representamos. Hoje ainda mais somos simplesmente funcionais, e funcionais não no sentido mais íntimo e verdadeiro de nossas vidas, mas somente naquilo que colabora para servir ao ciclo produtivo econômico. Rotulados como médicos, advogados, empresários, garis, lixeiros, etc. Estas são nossas ocupações. Uma mulher não pode ser mãe, se não trabalha então ela é “do lar”, ou “prendas domésticas”. Um homem não pode ser pai ou marido, na falta de ocupação profissional, pode ser “desempregado”, “inválido”, “aposentado” ou pior ainda “vadio”, “desocupado” ou “vagabundo” mesmo. Pode parecer irrelevante mas ao olharmos os valores que preenchem nossa sociedade consumista, onde busca-se com cada vez mais avidez conquistar mais e mais, contrapomos isto com a mensagem de uma comunidade inicia o relato do nascimento do messias, onde se afirma que Maria a mãe de Jesus estava prometida para José, José seu marido. Não fala de José o carpinteiro, mas de José marido de Maria. José filho de Davi, não porque ele tivesse um reino ou um palácio por ser descendente do rei, mas porque ele pode assim passar esta origem genealógica a Jesus. Assim é apresentando aquele que criou o messias, aquele que entre os homens assumiu em amor e obediência, a paternidade de Jesus.
            A sociedade que nos rotula, pela contribuição para a atividade econômica, e nos mede pela capacidade de consumo, também exige justiça, mas uma justiça que não passa de vingança. Nossa justiça não restitui nada a ninguém, mas apenas pune. Ao passo que a justiça de Deus apresentada pelo texto estudado, nos mostra que ela deve ter como alicerce o amor, o amor que fez com que José o marido de Maria, sacrificasse sua própria imagem frente à sociedade, para poupar a de sua esposa, que aceitou como filho aquele que não gerou, lhe desse um nome. Contra todo o legalismo judaico, estes judeus cristãos pregavam que o amor é superior a lei. Eles não rejeitam a lei, mas rejeitam o resultado dela caso este não seja o amor.
           
           
           
           
           
Bibliografia.
Bíblia Almeida Revista Corrigida e Fiel – http://www.bibliaonline.com.br
Bíblia Tradução Ecumênica. São Paulo; Loyola
VAUX R. de. Instituições de Israel.São Paulo;Vida Nova, 2004
ULRICH, LUZ. El Evangelio Segun San Mateo. Salamanca; Ediciones  Siguem, 1993.
HENDRIKSEN, Willian. El Evangelio Según Mateo. Kalamazoo; Libros Desafio, 2007.


[1]  Bíblia Tradução Ecumênica Brasileira, p.1856-1857.
[2] LUZ, Ulrich. El envangelio segun San Mateus (p.79).
[3] HENDRIKSEN, Willian, p.104.
[4] Bíblia Almeida Revista Corrigida fiel – http://www.bibliaonline.com.br
[5] HENDRIKSEN, Willian, p.105.
[6] VAUX R. de. Instituições de Israel
[7] HENDRIKSEN, Willian, p.105.
[8] LUZ, Ulrich. El envangelio segun San Mateus (p.138).
[9] LUZ, Ulrich. El envangelio segun San Mateus (p.137).
[10] HENDRIKSEN, Willian, p.114
[11] LUZ, Ulrich. El envangelio segun San Mateus (p.138).

2 comentários:

  1. Parabéns pela pesquisa. Você conseguiu produziu uma exegese técnica, profunda, mas que também alcança leitores interessados em seu próprio crescimento pessoal.

    O blog foi inaugurado com grande estilo.

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  2. Anderson.
    Obrigado, espero poder corresponder avançando a bom termo nos próximos anos.

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